Espraia-te, silêncio, busca-me, entre as pedras, pelos recantos redondos da areia, mas não vás por mim à beira-mar. Sabes, silêncio? As ondas rebatem, soltam-se e saltam e, quando não esperamos, ribombam e trovejam - imitação de fúria celeste. Agora, silêncio, agora é tempo de me embalares, caminho furtivo, busca do adormecer, rusga poética na dormência do sol-pôr.
Amiga: A vida é um sussurro que percorre as folhas do calendário deixando-me atónito. Cada ocaso é um só, e as colinas escorregando pelas águas tornam-se marcos onde o tempo, forçosamente, se imobiliza. Sei que para ti, caríssima, o tempo é um escolho, deve ser esquecido enterrado, até. Mas ele vulgariza-te nas sombras que antecedem as rugas. Sabes? Foi ontem que nos conhecemos, que brincámos com as palavras em jardins escorados por esplanadas e risos. Hoje, a galhofa é outra: o tempo saltou para as nossas cavalitas tapando-nos os olhos e a boca, alimentando-se de nós. Hoje, somos espelhos de todos os prazos; somos resquícios de uma alegria tão efémera como as folhas do calendário. Somos pasto do tempo; quebra, pois, os relógios e o sortilégio das horas! Um beijo grande. Jaime
(fontes das imagens: 1ª - https://br.depositphotos.com/36283215/stock-photo-calendar-pages-flying-away-time.html 2ª - http://www.oh-i-see.com/blog/2014/01/09/reflections-on-time-passing/)
Uma flor no crepúsculo, o aroma do sol pôr, as vinhas prenhas, ao longe, a estrada deserta é cortada pela poeira, nuvens esquecendo o porquê; quantas vezes este quadro? talvez com outra paisagem, já extinta, outras envolvências esquecidas... há, no entanto, um mistério, uma gota de paz, serenidade talvez; os caminhos dolentes, as vagas trajectórias erigidas sob ventos puídos pelos enigmas que nos envolvem no abraço da estrada deserta e da sua poeira quase metafísica... (21/11/13, 15H27)
("Quando te deitares ao caminho, faz dos teus olhos amigos da estrada; quem sabe se não verás tempos já esquecidos..." fala de Plutarco a Aristeu, seu discípulo grego) (foto do autor obtida com telemóvel)
"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."
Naguib Mahfouz, romancista egípcio, na mensagem que enviou, em 1988, à Academia Real Sueca a agradecer o Prémio Nobel da Literatura, o único a ser atribuído até à data, a um escritor árabe
(cit. em "Dicionário do Islão", Margarida Lopes, ed. Notícias)