Dizer um poema é orar; todos os poetas são abençoados por Deus. (adapt. de Rosa Lobato de Faria)
sábado, 31 de agosto de 2013
K
rampa
Afasto-me, os meus braços nem procuram os teus. Não é zanga, qualquer reacção, não é sequer dor, aquela dor que dói nas lembranças emergentes. É uma parede, uma armaria cheia de pistolas nunca usadas, brilhantes no seu desalento, é a vida, e tantas essas coisas que nos vão desapegando. Parede: construção a dois, Armaria: acasalada a dois, Vida: extinta a dois. É no colo do adeus que mais te encontro, é no teu sorriso brando que me descaem as memórias: um poema meu (escrito e esquecido), que me leste risonha, gritos ao vento invernoso que nos abraçava o abraço, o caminho que insistíamos ser nosso, palmilhado pelos banhistas a toda a hora... Agora somos sorrisos desmaiados, incolores.
Alforriado, abraço o vazio, os meus ombros, a volta do silêncio, o prazer, o conforto da mudez. E é nos passos surdos, na semi-obscuridade que reabro um título: "Os belos e os malditos". (Foto do autor obtida com telemóvel: Castelo de Torres Novas)
Quero que a ferida, no seu esgar triunfante, vá morar para lá longe, perto do mar e que se dissolva, e que se afunde num esquecimento, numa vaga absolvição, de tal modo que a mão jurada em gesto de cruz se funda nas águas afluentes...
("Caminha com as feridas que o caminho te der, não as poderás evitar, mas é na sua cura que aprenderás que Deus, e o caminho, te dão tudo o que precisares." Fala de Paulo a Onésimo)
"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."
Naguib Mahfouz, romancista egípcio, na mensagem que enviou, em 1988, à Academia Real Sueca a agradecer o Prémio Nobel da Literatura, o único a ser atribuído até à data, a um escritor árabe
(cit. em "Dicionário do Islão", Margarida Lopes, ed. Notícias)