Dizer um poema é orar; todos os poetas são abençoados por Deus. (adapt. de Rosa Lobato de Faria)
quarta-feira, 2 de junho de 2010
K
khyros
Se os meus dedos agarrassem a sombra, a névoa que escorre pelos teus tempos; se as palmas das minhas mãos vaiassem as mágoas, as feridas que se escoam já pelas tuas ruelas; se os meus punhos nus esmagassem a cabeça disforme dessa tua tristeza; então seria o teu sorriso o cais, o refúgio, o caminho largo dos meus pulsos libertos!
Já a brisa se despenhou. Cristais esguios, línguas e madeixas de troncos ensimesmados, arcas de tesouros vazias sem pedras, nem nada. Velhos búzios encaracolam sopros de marés que nunca houve nem na mais mítica das quimeras. As marés do mare nostrum trazem relíquias em forma de ânfora, mas elípticas, parabólicas, talvez velhas equações já esquecidas. O volume do cone quase dá os litros da mistura, assim detida. Um quarto de rajada leva os restos de brisa, melenas navegando. Com tão pouco, miríades de coisa nenhuma afastam-se de rojo, entre dois esgares duma hárpia esvoaçante.
"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."
Naguib Mahfouz, romancista egípcio, na mensagem que enviou, em 1988, à Academia Real Sueca a agradecer o Prémio Nobel da Literatura, o único a ser atribuído até à data, a um escritor árabe
(cit. em "Dicionário do Islão", Margarida Lopes, ed. Notícias)