segunda-feira, 30 de setembro de 2013

K

Retrato

A gosto
sorriu,
a boca semiaberta,
uns dentes quase sedutores,
faiscantes.
O amor, para ela,
fora sempre um caminho recto,
tombado,
orlado de flores, comodidades…
alguma solidão, certamente,
mas nem um desgosto.
Não era bonita:
o sol de Agosto reflectia,
em jeito de troça,
um brilho incerto,
nos seus cabelos;
os olhos,
beges,
nada contrastavam
com a sua tez.
E o riso? Gargalhadas trémulas,
em jeito de guincho simiesco.
A contragosto visitava-a:
Era muito azarada ao póquer!

(publicado em 77 palavras
Desafio nº 50 – Com as palavras AGOSTOA GOSTOA CONTRAGOSTODESGOSTO)
(fonte da imagem:

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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

K

A recomeçar

[IMG]
Fogo,                           
pena,                   
sorriso:
três objectos-sentimento
que a assaltavam
hora a hora,
minuto a minuto,
tiquetateando,
forçando-a ao sorriso,
à pena,
depositando-a no fogo.
E tudo a recomeçar,
mecanicamente,
melhor, digitalmente,
com a certeza
de um programa pavoroso
criado pelo absurdo.
Já não eram só as mãos,
que tremiam,
ou os joelhos que chocalhavam
num tango bizarro;
toda ela era um estorvo
para si mesma.
Aquele ciclo:
fogo,
pena,
sorriso,
era a mortalha,
o regresso
a caminhos extintos...
Desafio nº 1 – palavras impostas: pena, sorriso, fogo
(fonte da imagem:

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segunda-feira, 23 de setembro de 2013

K

vontade

Era uma vontade asceta,
uma Lua teimosa,
desfragmentada,
que vigorava
no tempo em que
o caminho era a esperança.
Falaram em luzes,
em túneis,
em números
(algarismos tingidos).
Apenas se soube esperar,
enquanto o líquido denso
escorria pelas frontes abaixo.
Pressentia-se
o para lá,
o mais além,
mas não se ousava dizê-lo,
no terror do descarrilar.
A paisagem horizontal,
pastosa,
era também fusão
imaculada e granítica,
numa certeza apenas:
que os números fossem
redutores e mágicos!

("Os números dão-te,
mas tiram-te:
faz com que te sirvam
com prudência."
Fala de Cleantes de Assos,
pensador estóico,
a Creso, rei servo
de ouro e outros 
números)

(fonte da imagem:
http://thehardmanshousent.blogspot.pt/2012/06/switzerland.html)

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sábado, 14 de setembro de 2013

K

Querida Amiga


Lisboa, 16/07/2013

Querida
Amiga, o tempo escorrega na impaciência dos tolos.
Acho que procuro embrenhar-me no meu quotidiano e espreitar os números (os teatrais e os outros, os que doem).
Baixar a cabeça pode não significar submissão, antes o assegurar-me do caminho a seguir, pelos marcos deixados por quem já viveu isto também; e sobreviveu (pelo menos para assinalar o caminho).
Tento não me afundar no umbigo, minha Amiga, tento abrir os braços e as mãos, não deixar a fadiga dos materiais corroer as minhas frontes.
Há quanto tempo não nos vemos? Agora, medem-se as datas em a.c. e d.c. com um significado bem diferente: antes e depois da crise... terá sido, pois, em a.c que estivemos juntos.
Há uma crosta de boa aparência aqui em Lisboa. Tudo parece estar nos lugares certos, até os jornais desportivos (fascinados sempre por alguém). Mas, ali ao lado, há quem nos puxe de volta para os números, para os acontecimentos, para algumas pessoas...
E parece que vivemos num universo dual com matizes ora faiscantes, ora mortiças. Talvez hajam muitas realidades simultâneas... Como estamos imersos em números também coexistimos (quem sabe?) com os seus simétricos e com os seus inversos: a via crucis de uma Álgebra que nos vai triturando.
É assim que te envio grandes quantidades de abraços e beijos, ficando tu certa de uma saudade de valor maior do que o défice!

Jaime

(fonte da imagem:
http://www.blogging4jobs.com/job-search/how-to-write-your-own-killer-cover-letter/)

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"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."

Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico. Leia, assine e divulgue! Sopro Divino

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