Dizer um poema é orar; todos os poetas são abençoados por Deus. (adapt. de Rosa Lobato de Faria)
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
K
em azul...
Hoje, sento-me no colo do Tempo. As minhas mãos enroscam-se nas farripas das suas horas, encosto-me ao seu peito tiquetaqueante nos segundos; deslizo
e, nessa tranquilidade cadenciada, espraio-me pelos azuis
que o lacrimejam pela sua beleza abaixo. No colo do Tempo vislumbro-me no futuro e, no arrepio, sinto os passos de algo que me esperaria, mas que me encontrou saciado.
Então, num jacto imenso, empurro os segundos, suspenso, até a Paz, a verdadeira Paz, me imergir num mergulho leitoso, tépido.
Estar só, é uma bênção bipartida, uma herança quase maldita nas flores e palavras que lembramos. Por isso esquecemos o tempo, e o espaço quase se nega aos sons que as palavras tentam povoar. Provém pois de agora o arco, a flecha que é a acuidade do cirurgião que rasga as palavras cintilantes. Se houvesse uma solidão exacta, então, na sua solidez,as palavras brotariam como pólen,
espalhando-se no semental
dos campos,
das searas,
dos casais
que no pino do sol,
colheriam o pão,
polvilhado pelas desobediências
castas de olhos já vítreos.
(inspirado em moriana, numa publicação no seu blogue) (foto do autor obtida com telemóvel: entrada de Ferreira do Alentejo)
É de bronze o semblante, é de pedra a certeza, o manto de ontem que faísca. Reflectes as paredes, os muros que sonhaste; as tuas mãos, as veias que se canalizam azuis - mar de espumas triunfantes - regressam às águas mornas do Mesozóico, às tremuras dos "belli". Talvez hoje, cavalgando as crinas do Tempo, sejas a geração última, o derradeiro soçobrar de uma sombra escusa.
"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."
Naguib Mahfouz, romancista egípcio, na mensagem que enviou, em 1988, à Academia Real Sueca a agradecer o Prémio Nobel da Literatura, o único a ser atribuído até à data, a um escritor árabe
(cit. em "Dicionário do Islão", Margarida Lopes, ed. Notícias)