Dizer um poema é orar; todos os poetas são abençoados por Deus. (adapt. de Rosa Lobato de Faria)
segunda-feira, 27 de abril de 2015
K
entardece
Um corpo marcado pelo vento, as águas formam trilhos, espreguiça-se o compasso, a bússola treme. O vento tresmalha algumas folhas, só se ouve o restolho. A colina beija, lentamente, o riacho que se espalha na brandura de um entardecer; o sol fixa-se, um gesto expectante ganha forma, e o tempo pára, numa apoplexia deslumbrante: cerejas misturam-se no pó, amoras mergulham sôfregas nos córregos, a brisa morna tudo envolve numa prodigiosa salada de frutas. Entardece então.
"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."
Naguib Mahfouz, romancista egípcio, na mensagem que enviou, em 1988, à Academia Real Sueca a agradecer o Prémio Nobel da Literatura, o único a ser atribuído até à data, a um escritor árabe
(cit. em "Dicionário do Islão", Margarida Lopes, ed. Notícias)
1 Comentários:
Um entardecer em que a Natureza e o corpo mutuamente se desnudam...
Um beijo, Jaime.
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